Do Ouro ao Sol: conquistando o apoio de comunidades locais para solar centralizada em Minas Gerais

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Nos últimos anos, construtores instalaram grandes quantidades de capacidade solar no estado de Minas Gerais. De fato, o estado lidera tanto em termos de capacidade instalada de geração centralizada, com 3.125 MW em operação, quanto em projetos outorgados pela Aneel, com mais 14.741 MW, de acordo com o banco de dados da agência reguladora.

Conseguir a aprovação da comunidade local para a instalação desses grandes projetos de geração centralizada de energia solar tem sido um desafio em diversos lugares globalmente. Mas muitos brasileiros receberam bem as oportunidades trazidas pelos projetos, relata nesta entrevista Priscila Brandão, jornalista que viajou para as cidades de Pirapora, Várzea da Palma e Quem-Quem, em Minas Gerais, para registrar as histórias dessas pessoas.

No início deste ano, você e sua equipe embarcaram no projeto “Do ouro ao sol“, patrocinado pela Nextracker, onde passaram 10 dias em três projetos solares de grande porte no Brasil, conversando com as pessoas que tiveram suas vidas impactadas pelo desenvolvimento da energia fotovoltaica. Qual foi a sua primeira impressão?

As imagens são fantásticas, nunca tinha estado em uma central solar tão grande. O meu trabalho anterior consistia em entrevistar pessoas, falar sobre os problemas, os benefícios e recolher toda a informação [sobre a energia fotovoltaica], mas nunca tinha visto um projeto tão grande. Quando fui ao primeiro projeto, que foi a menor das três centrais que visitamos, em Pirapora, já foi uma surpresa. Há realmente um mar de módulos. E foi surpreendente para mim.

Os três projetos que visitou estão localizados no estado de Minas Gerais. O que pode me dizer sobre a região?

Essa parte de Minas Gerais é mais rural, tem cidades pequenas – mas têm uma porção muito grande de comida no prato, tem que comer muito! A população está satisfeita com essa transformação que está acontecendo lá, com o desenvolvimento da energia solar em escala, porque as centrais criaram empregos. Quando se tem uma cidade pequena com uma grande indústria para chegar, a população local vislumbra trabalhar nessa indústria. Foi necessária muita capacitação e formação, porque a indústria solar é muito nova para a população local.

Mas mesmo quem não foi empregado diretamente também se beneficiou com a chegada das centrais solares. As pessoas das cidades locais viram os seus negócios crescer. Kaká é o proprietário de um restaurante e o seu negócio cresceu 30% desde a chegada da central solar. O prato principal que ele oferece é com um peixe do rio – chama-se Surubim. É um prato muito famoso.

Kaká me contou que, quando a central solar estava sendo construída, nem sequer havia hotéis suficientes para os trabalhadores de fora ficarem. Por isso, os habitantes locais disponibilizaram camas nas suas próprias casas. Isto também criou um rendimento adicional.

Um desafio que a indústria solar enfrenta em todos os locais é ganhar a aceitação das comunidades locais, especialmente no caso das grandes usinas centralizadas. Nos seus 10 dias em Minas Gerais, ouviu pessoas contra o desenvolvimento fotovoltaico?

Algumas pessoas pensam que as centrais solares estão tomando o lugar da produção de alimentos. Dizem: “nós não comemos módulos solares”. Percebi que algumas pessoas acham que, conforme instalem módulos solares, vai faltar alimento.

Por outro lado, também temos muitas pessoas que tiveram benefícios nas suas vidas ou nos seus negócios. Muitas pessoas tiveram, de fato, uma oportunidade de crescer nas suas carreiras.

As pessoas com quem falou estavam interessadas no aspecto da sustentabilidade dos projetos fotovoltaicos?

Perguntei: “estão contentes por trabalharem com energia limpa e por fazerem algo que vai ser positivo para a próxima geração?”. Mas, estou sendo sincera, eles não têm este sentimento de sustentabilidade que existe nas grandes cidades. Estão felizes porque as suas vidas estão crescendo e estão gratos pelas oportunidades.

Mas quanto ao significado maior de estar numa indústria sustentável, eles ainda não têm esse sentimento. Talvez agora, ao verem o que vai acontecer e o que está acontecendo nas suas vidas, tenham este sentimento mais profundamente. É ótimo para elas porque as suas vidas mudaram. Mas isso não quer dizer que agora sejam pessoas sustentáveis e preocupadas com questões ecológicas. 

Havia também uma componente de gênero nas histórias que ouviu, não é verdade?

Sim, e essa parte da história é muito importante para mim: as mulheres e as moças. Em alguns destes locais menores há poucas oportunidades para as jovens e para as mulheres. A Nextracker está fazendo um trabalho sensível voltado para elas. Um exemplo é a história de Ramony. Ela frequentou a universidade, formou-se como engenheira, mas estava trabalhando como professora em uma escola para crianças. Teve a oportunidade de fazer uma formação com a Nextracker e está agora atuando como engenheira nas centrais fotovoltaicas. O nível profissional de Ramony é muito mais elevado e ela trabalha atualmente com a Nextracker. Isso realmente me tocou muito, porque estamos num mundo que é mais difícil encontrar oportunidades para elas.

A indústria de Minas Gerais é fortemente marcada pela mineração de ouro e foi o que inspirou o título do projeto Do Ouro ao Sol. Como você compara essas indústrias?

Acho que é totalmente diferente. Os garimpeiros e outros mineiros tinham a ver com exploração e a indústria solar é o oposto – tem a ver com inclusão e trazer os benefícios para o nosso país. Isto é algo em que estamos muito empenhados no Brasil.

O projeto em Pirapora é o primeiro projeto solar de grande escala no Brasil e até utiliza módulos que foram fabricados no país, o que é muito especial. Portanto, é exatamente o contrário: o ouro foi extraído de nós, enquanto a produção de energia com o sol nos traz algo.

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