A necessidade de uma regulamentação clara e abrangente para o armazenamento de energia foi um dos principais temas discutidos nos recentes eventos do setor elétrico. Nesse sentido, a pv magazine Brasil conversou com Jonas Becker, diretor da ONE, empresa de representações do Grupo Colibri Capital, para compreender as perspectivas do mercado e os desafios regulatórios que definem o futuro do armazenamento de energia no país.

Imagem: Grupo Colibri
A empresa que possui 46 usinas voltadas a Geração Distribuída (GD) compartilhada ou autoconsumo remoto que somam 140 MWp de potência, vem acompanhando o tema e se aprofundando nas soluções de BESS para compor seu portifólio de geração. De acordo com o executivo, a solução a ser implementada vai depender de como o marco regulatório vai permitir a implantação da tecnologia e a sua devida remuneração.
Para Becker, a falta de um marco regulatório impede a consolidação de investimentos em baterias e atrasa uma das transformações mais esperadas da matriz energética nacional. Ele acredita que as normas devam ser publicadas até 2026, criando o ambiente necessário para o avanço dessa tecnologia no Brasil.
Segundo o executivo, a urgência da pauta também foi reforçada por Markus Vlasits, presidente da Associação Brasileira de Soluções de Armazenamento de Energia (ABSAE), que defendeu a regulamentação como fator decisivo para conferir previsibilidade aos agentes de mercado e destravar projetos de armazenamento. “O armazenamento não pode ser visto com a mesma velocidade e capilaridade da geração solar distribuída. É uma tecnologia mais complexa, que exige cautela e responsabilidade nos investimentos”, afirma Becker. Ele lembrou que o país ainda carece de dados consolidados sobre degradação e desempenho das baterias em diferentes aplicações: residenciais, comerciais ou industriais.
Investimentos travados pela ausência de regras
Becker é enfático ao dizer que não haverá investimentos significativos em baterias antes da regulamentação. A ausência de regras claras, segundo ele, torna o ambiente incerto e desestimula o capital privado. “Hoje, ainda navegamos no escuro. Tudo depende das condições de rede, das tarifas locais e das definições regulatórias. A regulamentação é o ponto de partida”, afirma.
O executivo também destacou que o ministro Alexandre Silveira estuda uma forma de ressarcir os donos de ativos que tiveram energia cortada (curtailment), mas Becker alerta que essa solução pode gerar custos adicionais para o setor. “O caminho mais eficiente é permitir o uso das baterias para evitar que novos cortes aconteçam. O futuro do sistema passa por isso”, diz.
Becker delineou ainda uma linha do tempo para o mercado: entre 2025 e 2027, o setor deve receber novos players, principalmente no segmento residencial, e entre 2027 e 2032, a tecnologia tende à consolidação e massificação.
Solução para o curtailment e o pico de demanda
O executivo reforça que as baterias são uma peça-chave para resolver o problema do excedente de energia solar durante o dia, permitindo que essa energia seja injetada na rede no horário de pico. “As aplicações vão desde o controle de frequência e serviços ancilares, hoje executados por hidrelétricas, até o fornecimento de backup em sistemas críticos”, detalha.
Ele lembra que países como Austrália, Estados Unidos e diversas nações europeias já aplicam baterias em larga escala, enquanto o Brasil ainda enfrenta lentidão na adoção. Mesmo assim, há sinais de avanço: “Temos visto um aumento da demanda, especialmente em residências de médio e alto padrão em São Paulo, que buscam segurança energética. É o mesmo público que, anos atrás, instalava geradores a diesel e agora opta por soluções mais limpas”.
Becker, no entanto, pondera que o backup doméstico, por si só, não será suficiente para massificar o uso de baterias. “O crescimento virá quando surgirem novos modelos de negócio, como as Virtual Power Plants (VPPs), em que o consumidor é remunerado por injetar energia na rede durante o horário de pico. Com o barateamento da tecnologia, a bateria vai se tornar tão comum quanto uma geladeira ou um ar-condicionado”.
Baterias como aliadas da rede elétrica
As recentes ocorrências de apagões no país também evidenciam o papel do armazenamento na resiliência do sistema elétrico. “Nossa rede é majoritariamente aérea; basta uma árvore cair para interromper o fornecimento. Com eventos climáticos mais severos, esse problema tende a aumentar. Baterias podem ajudar em falhas localizadas, especialmente em hospitais, data centers e residências de pessoas eletrodependentes”, afirmou Becker.
Distribuidoras como a Cemig já estudam o uso de baterias em regiões mais afetadas, o que, segundo o executivo, é uma medida concreta e necessária. No entanto, ele reconhece que o armazenamento não substitui soluções estruturais na transmissão. “Se o cabo cair, a bateria não resolve. Mas pode mitigar danos e reduzir o impacto social e econômico das interrupções”.
Geração Distribuída 3.0 e o papel do agronegócio
Em um evento do setor, o executivo destacou que o uso de telhados solares continuará em alta, enquanto a geração remota tende a se conectar ao Mercado Livre de Energia, com usinas menores, de 30 a 50 MW. “A GD virou um hábito de consumo. As pessoas se planejam para instalar solar quando têm condições, e isso não vai mudar”.
Entretanto, o desafio está na viabilidade econômica. Com o aumento de encargos, como o pagamento do “fio B”, a geração remota perde competitividade. Becker propõe que o país aproveite sua vocação agrícola e incentive o consumo de energia no agronegócio durante o dia, quando há maior produção solar. “Por que não estender a tarifa rural para o período diurno? Isso ajudaria a reduzir o desperdício de energia e impulsionar a descarbonização do setor”.
Caminho para a descarbonização e segurança energética
Becker encerrou sua fala com uma reflexão sobre o modelo energético nacional e a urgência de um marco regulatório que una segurança, previsibilidade e sustentabilidade. “O Brasil ainda depende fortemente da matriz hidráulica. Quando ela falha, recorremos às fontes fósseis. As baterias podem equilibrar isso, armazenando energia renovável e liberando quando necessário. É o caminho para uma matriz realmente verde.”
Para ele, o debate deve ser técnico e pragmático, sem espaço para polarizações. “Não há lugar para haters da energia renovável. O que precisamos são apoiadores conscientes, que entendam o papel estratégico da transição energética e busquem uma evolução justa e transparente”, conclui o executivo.
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