DSO: um novo maestro do setor elétrico brasileiro e as oportunidades para os prossumidores

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Nos últimos anos, os prossumidores brasileiros — consumidores que também atuam como geradores de energia e potência — conquistaram protagonismo no cenário energético nacional, sobretudo com a disseminação dos recursos energéticos distribuídos (REDs), como a energia solar fotovoltaica. Vale relembrar um conceito: na iluminação teatral, a ribalta é uma fileira de luzes que ilumina os atores. Assim, esses atores, que receberam incentivos para trazer os recursos distribuídos à luz de forma ágil e disruptiva, fizeram do Brasil uma referência mundial na expansão de capacidade de geração descentralizada. Isso se deu graças a uma política bem planejada, com incentivos bem estruturados, regras claras e marcos regulatórios que criaram condições para esse crescimento exponencial.

O resultado foi positivo: os recursos energéticos distribuídos agora representam a maior parte das novas capacidades de geração. Essa evolução trouxe benefícios reais e já deveria ter sido adequadamente valorada pela ANEEL, segundo recomendações do CNPE, para sustentar a sua valoração no médio prazo. Mas toda essa velocidade e crescimento exponencial também têm suas consequências, que abrem um leque de oportunidades — especialmente no que diz respeito ao gerenciamento da rede elétrica.

Se antes a rede de geração e distribuição era relativamente simples e unidirecional, ela hoje se transformou em um sistema complexo, multidirecional e interativo, onde a energia vem de diversas fontes e destinos. Nesse cenário, surge uma figura fundamental: o DSO (Distribution System Operator), um novo maestro, que, ao lado da ONS, terá a tarefa de coordenar e harmonizar esse palco do setor elétrico brasileiro.

O cuidado na estruturação do DSO: neutralidade, governança e múltiplos interesses

Para que o DSO seja verdadeiramente um agente facilitador e neutro, sua estruturação deve priorizar a independência e a transparência, evitando conflitos de interesse que possam prejudicar o mercado e os consumidores. Assim como a criação da ONS se deu para garantir a neutralidade na coordenação do sistema de transmissão, o DSO deve ser uma entidade imparcial, que não pertença a nenhuma distribuidora, concessionária ou agente com interesses comerciais que possam favorecer seus próprios recursos ou negócios.

Essa independência é fundamental para que o DSO possa atuar com imparcialidade, promovendo um ambiente de mercado justo, aberto e competitivo. Deve operar com governança participativa, estruturada em comitês e fóruns de consulta, que envolvam todos os agentes do setor — incluindo consumidores, prossumidores, agregadores, geradores distribuídos e reguladores — garantindo que suas ações estejam alinhadas com os interesses coletivos e o fortalecimento do sistema elétrico.

Um novo cenário de oportunidades e de transformação profunda

A implementação de um DSO neutro, bem estruturado e colaborativo representa uma verdadeira virada de página na história do setor elétrico brasileiro. Ele será o pilar fundamental para consolidar uma rede de distribuição inteligente, resiliente, moderna e sustentável, capaz de transformar a relação entre consumidores e energia.

O consumidor-prossumidor deixará de ser um simples usuário para se tornar um agente ativo, oferecendo e prestando serviços ao sistema, com potencial de gerar novos negócios, criar empregos e promover a inclusão social e tecnológica em todo o país. O DSO atuará como o maestro dessa orquestra de recursos, promovendo o equilíbrio entre inovação, segurança jurídica e justiça de mercado.

Se, por um lado, os desafios de sua estruturação são grandes, por outro, as oportunidades de acelerar o desenvolvimento sustentável do Brasil e de fortalecer sua economia são imensas. Para isso, é imprescindível que todos os interessados estejam à mesa, que haja diálogo aberto, governança democrática e um compromisso firme com o futuro compartilhado de um sistema energético mais eficiente, limpo e justo.

Quem tudo quer — o controle absoluto, interesses particulares ou favoritismos — pode acabar prejudicando toda a orquestra. Por isso, a máxima deve ser clara e universal: “Quem tudo quer, todos perdem.” A neutralidade, a inclusão e o equilíbrio serão as maiores forças motrizes de uma transformação que trará bilhões de investimentos, milhões de empregos e uma liderança sustentável para o setor energético brasileiro, velocidade e inovação na ponta dos dedos de cada cidadão.

O papel do DSO também é o de catalisador na transição energética, promovendo a descentralização, a democratização e o desenvolvimento de modelos de negócios inovadores e sustentáveis. Assim, ele será o responsável por operacionalizar um ecossistema de recursos energéticos distribuídos (REDS), com dados acessíveis, serviços inteligentes e conectividade em larga escala, de modo a criar um sistema mais justo, eficiente e de baixo carbono.

Como o DSO potencializa oportunidades para os prossumidores

A implementação de um DSO neutro trará enormes benefícios aos consumidores-prossumidores. Com ele, esses agentes poderão:

  • Participar ativamente do mercado de flexibilidade, oferecendo suas capacidades de resposta e armazenamento para equilibrar a oferta e a demanda em tempo real, por meio de leilões e plataformas específicas.
  • Operar como agregadores de REDs, formando usinas virtuais, microredes e comunidades energéticas que promovem a democratização dos REDs e estimulam a inovação tecnológica.
  • Prestar serviços de suporte à rede, como gerenciamento de baterias, resposta à demanda, suporte à estabilidade do sistema e resposta a disparidades de carga.
  • Participar de plataformas peer-to-peer, onde consumidores e prossumidores trocam energia de forma segura, transparente e eficiente.
  • Desenvolver e diversificar modelos de negócio, estimulando novas oportunidades de geração, armazenamento e troca de energia com a participação de múltiplos atores.
  • Essas ações consolidam o papel do prossumidor como um elemento ativo na manutenção da saúde do sistema, promovendo segurança, confiabilidade e sustentabilidade, além de facilitar a inserção de tecnologias disruptivas em escala nacional.

Por Carlos Café, sócio-fundador da AEVOSOLAR e vice-presidente da Associação Brasileira de Geração Distribuída – ABGD

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