Importação de módulos desacelera em meio a anúncios de novas rotas comerciais Brasil-China 

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Há uma desaceleração das importações de módulos, células e geradores fotovoltaicos no Brasil em 2025, em comparação com o observado no ano passado. O país importou US$ 722,2 milhões FOB (valor da mercadoria no local de embarque) desses equipamentos nos primeiros quatro meses do ano, contra US$ 1,079 bilhão em igual período de 2024, uma queda de 33%.

Os dados são do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, considerando nove Nomenclaturas Comuns do Mercosul (NCMs), que classificam as importações entre células, módulos e geradores fotovoltaicos (conforme tabela abaixo). 

Essa é parte de um cenário desafiador, com o aumento do imposto de importação; o alto custo financeiro de novos projetos no Brasil, com a taxa básica de juros em 14,75%; e a falta de reembolso do governo para os geradores pelo prejuízo com o curtailment, que tem levado a saída de grandes players internacionais do mercado brasileiro, disse o vice-presidente do Conselho Fiscal da Absolar, Daniel Pansarella, à pv magazine.

“Tudo isso fez com que o volume de vendas novas caísse a 15% do que era a expectativa do mercado para esse ano. Tem no mínimo uns cinco players internacionais saindo do Brasil e colocando todos os ativos brasileiros à venda [de geração centralizada, por causa do curtailment]. E na distribuição também, muitos fecharam a operação, somente aqueles maiores conseguiram sobreviver. Os menores estão se enxugando ou virando subdistribuidores”.

Daniel Pansarella, vice-presidente do Conselho Fiscal da Absolar.

No final de 2024, o governo federal aprovou um aumento do Imposto de Importação (II) de módulos fotovoltaicos de 9,6% para 25%, que resultou em aumento de mais de 8% no Capex de projetos, de acordo com estimativa da consultoria Greener. Além disso, cancelou as cotas de importação — limites progressivamente menores de valores de importação, divididos em períodos de um ano, até junho de 2027 —que teriam a redução do imposto garantido.

Produção local

O governo federal justificou que o aumento do imposto e o fim das isenções buscavam equilibrar a competitividade entre produtos nacionais e importados. Chegou a mencionar que o potencial de geração de empregos e investimentos na cadeia produtiva de módulos fotovoltaicos no Brasil, para uma demanda anual média de 17,8 GW, seria de aproximadamente 21 mil empregos diretos, 100 mil empregos indiretos, na instalação desses painéis, além de R$ 1,6 bilhão/ano em investimentos em pesquisa e desenvolvimento, no âmbito do programa Brasil Semicon. O mercado estima que as fábricas instaladas no país tenham em torno de 1 GW de capacidade produtiva por ano. 

De janeiro a abril de 2025, o valor das importações das células não montadas, consideradas insumos para a produção local de painéis, também caiu, de US$ 1,814 bilhão em igual período de 2024 para US$ 1,679 bilhão. Mas a quantidade das células importadas aumentou 46,7%, de 9 milhões de unidades para 13,2 milhões, na mesma comparação.

Também aumentaram o valor e a quantidade de importações de geradores fotovoltaicos, que normalmente envolvem kits com mais equipamentos além dos módulos.

Valor e quantidade de importação de módulos, células e geradores fotovoltaicos, por NCM, entre janeiro e abril de 2024 e igual período de 2025. Abra em uma nova janela para visualizar melhor. Fonte: MDIC.

Importações anuais

Considerando 2024 de janeiro a dezembro, o Brasil importou US$ 2,625 bilhões FOB de células, módulos e geradores fotovoltaicos. Desse valor total, 99,7% foram destinados para módulos montados (US$ 2,617 bilhões), 0,22% para células fotovoltaicas não montadas (US$ 5,727 milhões), incluindo células orgânicas, e 0,8% para geradores fotovoltaicos (US$ 2,274 milhões). 

Houve uma queda no valor total em comparação com 2023, quando o valor das importações chegou a US$ 3,8 bilhões, mas a quantidade de equipamentos ainda aumentou em 2024, para 476 milhões de unidades, contra 198 milhões no ano anterior. A Greener estima que o equivalente a 22 GW foram importados para o Brasil em 2024 e 17,5 GW em 2023.

Diversificação de rotas comerciais para os módulos fotovoltaicos

A maior parte do valor importado em 2024, US$ 1,212 bilhão (46%,) entrou no país pelo Porto de Santos, em São Paulo, seguido pelo Porto de São Francisco do Sul, em Santa Catarina, que recebeu módulos e células com valor de US$ 270 milhões, correspondente a 10,32% do valor total, e pelo Porto de Paranaguá, no Paraná, com 10,01% (US$ 262 milhões). 

Já nas importações realizadas em 2025 até abril, a participação destes três portos no valor importado total caiu. No caso de Santos, para 40,14%, no de São Francisco do Sul, para 3,2% e, no do Paranaguá, para 9,74%. Ao mesmo tempo, as importações processadas na Alfândega de Salvador saíram de 8,6% do valor total em 2024 (US$% 225 milhões) para 12,3% nos primeiros quatro meses de 2025 (US$ 88,9 milhões). 

Considerando a quantidade estatística, o Porto de Santos perdeu ainda mais espaço neste ano, saindo de 45% do total em 2024 (214 milhões de unidades no ano todo) para 10,9% em 2025 (9 milhões até abril). Nesse critério, o Porto de Suape tomou a dianteira, com sua participação nas unidades totais importadas saindo de 18% em todo o ano de 2024 (86 milhões de unidades) para 29% em 2025 até abril (24 milhões).

 “Hoje, boa parte dos equipamentos chega por portos do Sudeste e precisa ser enviada por longas distâncias até os locais de instalação — muitas vezes no interior do Nordeste ou do Norte. Ter portos mais próximos pode significar menos custo, mais agilidade e maior previsibilidade nos cronogramas”, diz o CEO da MTR Solar, Thiago Rios, à pv magazine. A abertura de novas rotas pode ajudar a desconcentrar essas operações e aliviar gargalos, o que é essencial para manter prazos e viabilidade financeira dos projetos, avalia.

“Um dos principais desafios do setor hoje é o custo logístico interno, além da complexidade na liberação de cargas em portos muito movimentados.”

Thiago Rios, CEO do Grupo MTR.

Anúncios recentes de ampliação das rotas comerciais entre China e Brasil podem acelerar a diversificação dos portos de entrada de módulos e células importados no país.

Em abril, começou a operar uma nova rota marítima direta entre o Porto de Gaolan, na cidade de Zhuhai no Sul da China, e os portos de Santana, no Amapá, e Salvador, Bahia, nas regiões Norte e o Nordeste do Brasil. Os navio atravessam o Estreito de Malaca e o Cabo da Boa Esperança e não fazem escalas intermediárias.

“A gente pode ter um ganho de tempo importante, porque hoje as rotas que vem da China para Santos são de 35 dias. E as rotas que vão para Salvador ou Nordeste são de 45, 50, as vezes até 60 dias”, disse Pansarella 

A nova conexão deve permitir a redução de até 15 dias no tempo de transporte e uma economia de mais de 30% nos custos logísticos, em comparação com as rotas tradicionais, segundo o Ministério dos Portos e Aeroportos. A viagem terá duração aproximada de 30 a 35 dias. O Porto do Pecém, no Ceará, também deve ser beneficiado pela nova rota, reduzindo o tempo de frete da China para o Ceará para cerca de 30 dias. 

“Como a China é a principal fornecedora global de módulos e inversores, reduzir o tempo de transporte e os custos com deslocamento representa um ganho importante para todo o mercado”, diz Rios. “Mais rotas diretas e frequentes da China para o Brasil — especialmente para regiões mais próximas dos grandes polos de geração solar — têm potencial de transformar a cadeia logística. Investimentos em centros logísticos próximos a esses novos portos também podem reforçar essa vantagem”, diz o CEO da MTR. 

Para agilizar as entregas, adiciona Pansarella, o desenvolvimento da cabotagem, o transporte marítimo doméstico, no Brasil é crucial, pois as novas rotas marítimas podem não atender diretamente todos os portos brasileiros. 

Na geração distribuída, o impacto positivo em termos de redução de prazos de entrega só seria sentido a longo prazo, após a absorção dos estoques existentes, avalia Pansarella, com algumas distribuidoras com até seis meses de estoque. 

Por outro lado, “com entregas mais rápidas e previsíveis, é possível que as empresas do setor reduzam a necessidade de manter grandes estoques locais. Isso representaria uma mudança importante no modelo atual, que exige reservas maiores para lidar com incertezas logísticas”, diz Rios. 

Painel no evento de inauguração da nova rota marítima direta Brasil-China, em Brasília, ilustra trajeto dos navios. Imagem: Prefeitura de Santana (AP).

Corredor Bioceânico e ampliação de ferrovias

Além de facilitar a importação de insumos industriais e tecnológicos vindos da Ásia, o novo corredor marítimo inaugurado em abril atende zonas estratégicas de produção agrícola e mineral, consolidando os portos de Santana e Salvador como hubs para o escoamento desses produtos.

Um segundo projeto, esse ferroviário, ampliaria ainda mais as rotas comerciais entre o Brasil e a China, dessa vez pelo Pacífico, com integração ao transporte marítimo no Sul da Bahia. O governo federal estuda a viabilidade de um Corredor Bioceânico Brasil-Peru, conectando o Porto Sul, em Ilhéus, no Oceano Atlântico, ao porto peruano de Chancay, no Oceano Pacífico, distante cerca de 80 quilômetros de Lima.  

A ideia é implantar um corredor ferroviário para transporte de carga no Brasil , que de leste a oeste passaria por Bahia, Goiás, Mato Grosso, Rondônia e Acre. A China deve elaborar um novo estudo para a implantação do Corredor Bioceânico Brasil-Peru, que visa criar uma rota estratégica para o comércio internacional entre os dois oceanos, expandindo o comércio entre o país asiático e a América do Sul. 

“O Brasil exporta US$ 350 bilhões todos os anos e mais de um terço desse valor se destina à China. Do que nós exportamos para os chineses, 60% é minério de ferro e soja, que precisam ser escoados por meio de ferrovias. É muito mais eficiente, não só do ponto de vista econômico, mas também do ponto de vista ambiental”, complementou o secretário Nacional de Transporte Ferroviário do Ministério dos Transportes, Leonardo Ribeiro. 

A nova rota multimodal marítima e ferroviária poderia reduzir o tempo de entrega de equipamentos no Brasil e oferecer uma alternativa às rotas superlotadas ou mal conservadas. O transporte ferroviário também poderia ser mais econômico para componentes pesados das plantas solares, como trakers, cabos e outras estruturas, e até para os módulos, desde que o manuseio seja minimizado, observa Pansarella.  

Os anúncios recentes de ampliação de rotas comerciais entre Brasil e China atendem diversos setores da economia e não solucionam os desafios mais imediatos do setor fotovoltaico, mas podem representar redução de custos e de tempo de frete no futuro. Além disso, incentivar a exportação pode incentivar o consumo de energia no país, outra barreira importante para a expansão da geração solar atualmente.

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