Curso básico para instaladores: Sombreamento e outras formas de descasamento

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1.   Visão Geral

Exemplo de sistema fotovoltaico com sombreamento pela árvore numa manhã de inverno, modelado no software PV*SOL premium

Imagem: Solarize

Descasamento (inglês “mismatch”) ocorre quando as características elétricas de módulos interconectados não são iguais. Possíveis causas são

  • Defeitos técnicos;
  • Diferentes modelos;
  • Insolação diferente devido a sombreamento parcial (veja figura acima) ou instalação em planos divergentes (consulte capítulo 3).

2.   O Efeito Elétrico do Descasamento

Frequentemente se escuta que um módulo sombreado inibe a série inteira de módulos (string) de gerar energia, em analogia ao caso de um rádio com pilhas, das quais uma está esgotada. Essa comparação é simplista demais – no nosso caso precisamos analisar a curva característica do string.

Curvas características geradas no software PV*SOL para a situação da figura 1, com sombreamento

Imagem: Solarize

Vamos aproveitar o exemplo da figura acima: do string que ocupa a metade da esquerda do telhado, quatro módulos recebem pleno sol e os outros têm algum sombreamento (o software informa valores entre 2% e 8%).

A figura 2 retrata a curva característica do string no exato instante daquela imagem.

  • A curva azul (corrente versus tensão) evidencia que apenas parte dos módulos consegue gerar a corrente total de aprox. 2,7 A, enquanto o restante é limitado a uma corrente de 0,8 A;
  • A curva preta (potência versus tensão) apresenta dois máximos locais, um com um pouco mais de 500 W e o outro pouco acima de 300 W.
  • Se o inversor conectado ao string encontrar o ponto PMP1, então ele vai fornecer 500 W. Dependendo das condições, ele pode encontrar somente PMP2 e permanecer na geração de 300 W. Ambos os pontos não aproveitam a potência dos módulos por completo (veremos alternativas mais adiante).

Já a figura acima mostra a curva característica duas horas depois, quando todos os módulos se encontram sob pleno sol. As duas curvas são uniformes com somente um ponto de máxima potência, com mais de 2000 W.

Curvas características sem sombreamento

Imagem: Solarize

3.   Diodos de Desvio

O descasamento não somente causa perdas, ele também pode danificar módulos, devido à conexão em série das células: quando todas as células recebem a mesma radiação, elas produzem a mesma corrente.

No momento em que uma célula é sombreada, ela deixa de produzir e vira resistência por onde passa a corrente gerada pelas outras células.

O percurso solar nas estações do ano.
Fonte: pacearquitetura.ning.com

Imagem: Solarize

Em consequência, a célula aquece (efeito hot spot). Sem proteção, este aquecimento poderia até derreter a célula. Por isso, os módulos contam com diodos de desvio (by-pass), que conduzem a corrente reversa, tirando as células inoperantes do circuito.

Normalmente, há três diodos de desvio por módulo, cada um protegendo duas fileiras do módulo.

Em módulos Half-cell (veja cap. 3), a perda por sombreamento é reduzida, porque as células na metade superior são conectadas em paralelo às células na metade inferior.

4.   Sombreamento

Vamos analisar o grande vilão, o sombreamento, começando pelo percurso do sol.

4.1.        Geometria solar

A figura acima mostra o percurso do sol para a latitude do Rio de Janeiro:

  • Durante o inverno, o sol nasce no Nordeste, passa pelo Norte, e se põe no Noroeste;
  • No verão, o percurso começa no Sudeste e termina no Sudoeste. O ápice chega ao zênite no solstício do verão (dia 21 de dezembro);
  • Ao longo do ano, o sol faz um percurso entre os dois apresentados na figura.

Em latitudes menores (locais mais próximos ao equador), a altura do sol no inverno é maior e o sol do verão passa mais ao sul. Já em latitudes maiores, o sol do meio-dia fica mais baixo e mais ao norte, com uma variação maior entre nascer e pôr do sol.

4.2.        Sombra distante

Sombreamento pelo horizonte no diagrama e na modelagem 3D no software PV*SOL premium

Imagem: Solarize

Objetos distantes da nossa planta solar afetam todos os módulos da mesma forma, num efeito liga/desliga. Eles são modelados como horizonte (figura acima).

Um meio simples para analisar o horizonte é o aplicativo Sun Surveyor para smartfones que projeta a curva solar na imagem captada pela câmera. Publicamos um manual de uso do aplicativo no site.

4.3.       Sombreamento próximo

Sombreamento pela antena parabólica

Imagem: Solarize

Objetos próximos ao nosso arranjo fotovoltaico causam sombra que afeta parte dos módulos e se “movimenta” pelos módulos conforme percurso solar diário e anual:

  • A sombra visível na figura 1 ocorre no dia 21/06 às 9hs. Durante o verão, a casa deste exemplo fica fora da sombra da árvore;
  • Em contrapartida ocorre sombreamento pela antena parabólica durante os meses do verão (figura acima).

4.4.      Análise da Situação

Frequência de sombreamento ao longo do ano (visualização PV*SOL premium)

Imagem: Solarize

A visualização da sombra (figuras 1 e 6) ajuda a compreender causas do sombreamento, mas retrata apenas certos instantes. O cálculo do percentual das horas com sombra ao longo do ano (figura acima) é uma informação mais rica e ajuda ao projetista tomar decisões sobre a colocação dos módulos:

  • Neste exemplo, percebemos um alto percentual próximo à antena, indicando que deveríamos afastar os módulos dela (ou então remover a antena para outro lugar);
  • Na sombra da árvore há outros valores elevados. Estes seriam os primeiros módulos a serem retirados se uma potência reduzida fosse suficiente para o cliente.

5.   Como Otimizar um Sistema com Descasamento

O projetista deve reduzir as perdas por descasamento, pela seleção do módulo apropriado, a melhor colocação dos módulos, a devida escolha da tecnologia do inversor e a adequada interligação do arranjo.

5.1.        Inversor String ou Multi-MPPT

O inversor string recebe a energia de uma grande quantidade de módulos em cada entrada dele (chamado de SPMP ou MPPT, veja capítulos 4 e 5) e exige mais homogeneidade no subarranjo que é conectado a uma entrada: Use o mesmo modelo de módulos, todos com a mesma orientação geográfica e com a mesma inclinação.

No entanto é possível dividir o arranjo e conectar partes com características diferentes em entradas MPPT separadas. No nosso exemplo é recomendável escolher um inversor com duas entradas, no mínimo, e separar os módulos do lado esquerdo, sombreados pela árvore, dos da direita, sombreados pela antena.

Além disso, deve-se escolher um inversor com otimização de sombreamento. Essa função percorre a curva característica (figura 2) de tempos em tempos com objetivo de identificar o maior PMP existente (ex. SMA Shade Fix).

5.2.  Micro inversores

Monitoramento de sistema com micro inversores

Imagem: Solarize

5.3.    Inversores com Otimizadores de Potência

O inversor fotovoltaico é feito de dois componentes principais: os Seguidores do Ponto de Máxima Potência (SPMP, inglês Maximum Power Point Tracker MPPT) e o inversor propriamente dito.

No conceito de otimizadores de potência, esses componentes são separados (figura 9):

  • O otimizador de potência, que contém o SPMP se torna individual para cada módulo, da forma que ele consegue extrair a maior potência a cada instante. Ele é fixado numa caixinha junto ao módulo;
  • O inversor efetua somente a conversão de c.c. para c.a. e atende a vários otimizadores.

Este conceito traz as mesmas vantagens do micro inversor em termos de melhor aproveitamento energético de cada módulo e monitoramento.

Ele ainda ganha nos quesitos de manutenção, por concentrar o inversor num aparelho instalado em local abrigado e acessível, e na escalabilidade da solução.

Otimizadores de potência são uma solução em instalações onde há a exigência de desenergizar o cabo em c.c. em caso de emergência: dependendo do modelo, os otimizadores desligam sua saída quando o inversor é desconectado da rede.

O primeiro capítulo do curso, Curso básico para instaladores: Fundamentos da energia fotovoltaica, está disponível neste link. O segundo, Curso básico para instaladores: o projeto do sistema fotovoltaico conectado à rede, está disponível aqui. O terceiro, Curso básico para instaladores: Tecnologia fotovoltaica e módulos, está disponível neste link. O quarto, Curso básico para instaladores: O inversor fotovoltaico, você pode baixá-lo neste link. O quinto, Curso básico para instaladores: Configuração do arranjo fotovoltaico com o inversor, neste link.

Hans Rauschmayer é um reconhecido especialista e pioneiro em energia solar no Brasil. Ele criou a grade educacional da Solarize Treinamentos Profissionais Ltda., da qual é sócio-gerente. Foi convidado a ministrar aulas em instituições como Sebrae e Senai, como também em diversas universidades e é frequente palestrante em eventos nacionais e internacionais.

A Solarize fez história quando conectou o primeiro sistema ongrid do Rio de Janeiro, com ampla repercussão na mídia. Ela oferece capacitação profissional desde 2008, consultoria e serviços de instalação. Além disso, trouxe para o Brasil a software PV*SOL para planejamento de projetos fotovoltaicos, que virou líder entre os integradores. Também atua em projetos sociais levando capacitação e geração de energia a comunidades carentes.

Os pontos de vista e opiniões expressos neste artigo são dos próprios autores, e não refletem necessariamente os defendidos pela pv magazine.

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